A Mass Poetry (http://www.masspoetry.org/) é uma organização sem fins lucrativos fundada em 2009 para apoiar e divulgar a poesia e os poetas do estado norte-americano de Massachusetts. Um dos principais objectivos que se propõem é levar a poesia até às pessoas. E haverá melhor maneira para o fazer do que colocá-la (literalmente!) nas ruas?
Em parceria com a Câmara Municipal de Boston, a Mass Poetry está agora a pôr em prática um programa a que deram o nome de “Raining Poetry”, e que irá trazer mais poesia ao quotidiano da cidade… sempre que chove.7
Utilizando a inovadora tinta invisível em spray da Rainworks (http://rain.works/), e com a colaboração da “Mayor's Mural Crew”, um grupo de jovens patrocinado pela Câmara, estão a ser pintados poemas nos passeios de Boston, em locais diversos espalhados pela cidade.
Esta tinta tem a particularidade de só ser visível quando molhada, o que faz com que nos dias de chuva os poemas pintados surjam como que magicamente do chão, para serem apreciados por quem passa e tornarem menos cinzentos os dias dos bostonianos.
Agora que a polémica calçada portuguesa (não a artística, felizmente) vai começar a ser progressivamente substituída por outros tipos de piso, esta seria sem dúvida uma boa ideia para que os nossos passeios ficassem menos tristes naqueles dias em que a chuva não dá tréguas a quem anda a pé.
Quem gosta de poesia sabe certamente o que é haiku – uma forma curta de poesia japonesa tradicional caracterizada por versos de 17 sílabas, divididas em três unidades métricas de 5,7 e 5 sílabas, e que se popularizou a partir de finais do séc. XIX.
Mas sabem o que é tanka?
Tanka é assim como que uma espécie de “avó” da poesia haiku. O termo significa “poema curto” e tem as suas origens no séc. VII. Um poema tanka tem trinta e uma sílabas e embora no Japão seja escrito tradicionalmente numa única linha sem cortes, quando transcrito para romaji (a forma de transcrição fonética da língua japonesa para o alfabeto latino) adopta a organização métrica de 5 linhas com 5, 7, 5, 7 e 7 sílabas. Nesta organização, as três linhas superiores (kami no ku) são por vezes separadas das duas linhas inferiores (shimo no ku), sendo a unidade superior a origem do haiku. O carácter breve da poesia tanka e a mudança das linhas superiores para as inferiores, que frequentemente marca o desvio ou a expansão do assunto que está a ser abordado, leva a que por vezes se compare o tanka com o soneto.
A era Heian, entre finais do séc. VIII e inícios do séc. XII, foi o período literário e artístico mais rico do Japão. A capital era então Heyan-Kyo, que hoje conhecemos como Kyoto, por ser a cidade onde residia a corte imperial. A poesia tanka tornou-se a forma poética preferida não só como entretenimento nos meios aristocráticos, mas também e sobretudo como meio de comunicação nos relacionamentos amorosos. Pela sua economia e adaptabilidade à expressão emocional, um poema tanka era a forma ideal de comunicação íntima depois de um encontro entre amantes, como agradecimento ou recordação, ou ainda para exprimir reflexões pessoais. E precisamente porque a sua finalidade era muitas vezes serem oferecidos a alguém, eram escritos sempre do ponto de vista pessoal do seu autor ou autora, embora não obrigatoriamente na primeira pessoa.
Neste período culturalmente florescente, os homens consideravam o japonês como uma língua menor, razão pela qual escreviam as suas obras poéticas ou de prosa em chinês, linguagem adoptada oficialmente pelo governo nos séculos IV e V. As mulheres aristocratas gozavam de bastante independência, e era visto com bons olhos que dos seus atributos artísticos fizessem parte a escrita e a recitação de poesia. Sendo a poesia tanka especialmente apropriada à verbalização da sensibilidade feminina e largamente apreciada pelo estrato social culturalmente mais favorecido, não é de admirar que as mulheres mais educadas a escolhessem como forma principal de expressão artística. Elas foram por isso as maiores produtoras e divulgadoras da tanka como arte maior, e por inerência – porque não escreviam em chinês, língua que não era habitual as mulheres usarem – as grandes impulsionadoras do japonês também como linguagem poética. Não o sendo exclusivamente, na sua época áurea a poesia tanka foi sobretudo feminina.
Título: TANKA Poesia dos séculos IX a XI
Autor: organização e versão portuguesa de Luísa Freire
Ano de lançamento: 2007
Editora: Assírio & Alvim
Publicação: Setembro 2007
Número de páginas: 80
Revisão: Ana Barradas
Há alguns anos dei com os olhos neste livro, e não resisti a comprá-lo. Adaptado e traduzido a partir da obra The Ink Dark Moon: love poems by Ono No Komachi and Izumi Shikibu, de Jane Hirshfield com Mariko Aratani, fala-nos de duas das mais importantes poetisas criadoras de tanka nos séculos referidos, e transcreve alguns dos seus poemas. Com uma sucinta, embora bastante recheada, explicação inicial sobre o período em que viveram e o percurso pessoal de cada uma delas, oferece-nos depois uma antologia da produção poética destas duas figuras femininas, ambas tendo ocupado uma posição deveras relevante no panorama artístico das suas épocas.
Deixo-vos aqui a reprodução de alguns dos seus poemas traduzidos, todos eles encantadores e plenos de sensibilidade.
Procurava eu um determinado livro nas minhas estantes (tarefa nem sempre fácil, apesar de eu os ter mais ou menos organizados, porque já são mais de oitocentos) quando tropecei num livrinho velho que há já algum tempo alguém deu a alguém que me deu a mim, por conhecer a minha paixão por livros, mas do qual eu praticamente me tinha esquecido. E é este “achado” curioso que quero partilhar hoje com vocês.
É um livro pequeno e fininho, com 10x15 cm e menos de 1 cm de espessura, e com uma capa forrada de tecido castanho, já meio desbotado e esfiapado.
As folhas estão muito amareladas pelo tempo, ligeiramente carcomidas nalguns pontos e com os bordos irregulares.
No verso da capa tem uma etiqueta com a indicação do encadernador.
E na primeira página, em cima, escrito a lápis, um nome feminino: Delmira.
Mas o mais interessante vem depois, numa página escrita à mão que nos diz que este é um livro de versos que pertenceu a Delmira Maria Assumpção da Costa (o nome está riscado a lápis e foi acrescentado outro por baixo). E a seguir, a data: Lisbôa 10 de Outubro de 1869. Não, não me enganei, é mesmo este o ano: 1869.
Este livrinho tem 147 anos de idade!
Foi escrito na segunda metade do séc. XIX, quinze anos depois da morte de Almeida Garrett e um ano antes de Eça de Queiroz publicar o seu primeiro livro.
Quando mo ofereceram nem reparei na data e só agora me apercebi de como ele é realmente antigo.
Mas há mais curiosidades. A caligrafia é belíssima, com os títulos dos poemas em letras desenhadas com sombreados e os textos em itálico e, por vezes, algumas palavras em destaque com letras maiores e mais elaboradas. São ao todo 18 poesias em 60 páginas numeradas, e uma folha rasgada no final que se percebe ser um índice.
Os poemas versam temas variados, mas não têm indicação dos seus autores. Há poemas de amor, políticos e populares. Numa breve pesquisa que fiz na net encontrei dois ou três devidamente identificados, mas da maioria não detecto qualquer vestígio.
A título de curiosidade, transcrevo em baixo um dos mais engraçados, exactamente com a grafia com que está escrito: