Crime quente num país frio
AURORA BOREAL
Åsa Larsson
Título: Aurora Boreal
Título original: Solstorm
Autor: Åsa Larsson
Ano de lançamento: 2003
Editora: Booket – Editorial Planeta
Publicação: 1ª edição – Maio 2013
Número de páginas: 382
Tradução: (não indica)
Revisão: Fernanda Fonseca
Com a leitura de “Aurora Boreal” fiz as pazes com os policiais nórdicos. Eu explico. Depois da surpresa entusiasmante que foi a trilogia Millennium do Stieg Larsson (está na minha lista de favoritos e já falei das suas adaptações ao cinema neste post), tenho andado a espaços a ler obras de autores que se enquadram no estilo a que se convencionou chamar nordic noir (policiais nórdicos, na nossa língua). Mas ou tenho tido azar, ou então estou a ficar demasiado esquisita, porque até agora os ditos cujos que escolhi para a “experiência” têm sido algo desapontadores. Não fiquei particularmente fã de Camilla Läckberg, nem de Jo Nesbø, e Mons Kallentoft também não conquistou a minha simpatia. Mas não me interpretem mal, não é que os considere maus escritores, ou que os livros que li sejam completamente sofríveis. Nada disso. Simplesmente não me senti “agarrada” durante a sua leitura, não me entusiasmaram a ponto de querer ler mais e mais.
Por sorte, este livro de Åsa Larsson veio inverter um bocadinho o sentido da opinião que eu estava a formar sobre os agora tão difundidos (e tão na moda!) policiais nórdicos. Não sendo um livro a que eu possa chamar excepcional, gostei bastante de o ler e conseguiu prender a minha atenção e o meu interesse até ao fim.
A história é simples: um assassínio com pormenores macabros é cometido numa comunidade algo fechada na região mais a norte da Suécia; a vítima é um famoso líder religioso, e o crime atinge contornos mediáticos. Entre o potencial aproveitamento da situação por alguns e os conflitos emocionais latentes de outros, o enredo vai-se desenrolando e revelando a pouco e pouco segredos escondidos, comportamentos divergentes e sentimentos de culpa não resolvidos. A noite quase constante, o frio e a neve são também protagonistas da história, onde a “heroína” é uma jovem advogada que regressa à sua cidade-natal para tentar apoiar a irmã do pregador assassinado, ambos seus amigos na juventude. Os esforços que desenvolve para resolver o crime são contrariados pelos membros da comunidade religiosa, da qual ela própria tinha sido expulsa alguns anos antes, e a coadjuvá-la tem apenas uma polícia fora do vulgar.
A escritora consegue neste livro um bom equilíbrio entre a forma como descreve o ambiente psicologicamente “pesado” em que a história decorre e os momentos de acção mais intensa. Apesar da chave para a resolução do homicídio começar a ser desvelada algum (bastante) tempo antes do final e de se perder um pouco do factor imprevisibilidade, existe mesmo assim um certo toque de surpresa no modo como se resolve o mistério e como depois o livro termina.
Gostei da escrita de Åsa Larsson, que não é nem demasiado simples a ponto de se tornar desinteressante, nem demasiado floreada a ponto de se tornar enjoativa. “Aurora Boreal” é o primeiro livro da série Rebecka Martinsson, que conta com cinco no total, todos já editados em português.
Uma das particularidades dos livros policiais nórdicos é a brutalidade e até mesmo impiedade dos crimes que dão o mote a cada história, o contraste entre o carácter quase passional dos homicídios e a frieza habitualmente associada aos habitantes dos países do norte da Europa. Esta aparente incongruência é sem dúvida uma das razões para o recente mas já enorme sucesso desta corrente literária que está a conquistar cada vez mais adeptos, e que mais não faz do que mostrar que as forças e as fraquezas que nos tornam humanos são transversais a todas as pessoas: por baixo de um temperamento aparentemente gélido pode existir por vezes um vulcão prestes a explodir.