À meia dúzia de pessoas que de vez em quando lê o que aqui escrevo, eu me confesso: sou uma ladra.
Pior ainda: devia ter vergonha, e não tenho. Assumo publicamente esta minha fraqueza, a adicionar àquela que já conhecem e que é o facto de ser livrólica. Neste caso, uma coisa juntou-se à outra, e não consegui resistir à tentação.
Então passo a explicar. Aqui há tempos, a Magda e a M* conluiaram-se para lançarem a elas próprias o desafio de durante 45 dias publicarem, uma vez por dia, um post sobre livros, cada dia tendo um tema diferente. Claro que as segui tão religiosamente quanto possível, e convido-vos a irem lá espreitar as valiosas e sempre inspiradas opiniões destas duas navegantes do incomensurável mundo dos livros e da escrita. Foi um desafio de fôlego, que elas cumpriram heroicamente, e por isso estão de parabéns.
Quis o acaso que recentemente eu aproveitasse uns dias de férias para tentar resolver o problema do grave estado da minha biblioteca/escritório, onde ainda subsistiam vários caixotes por esvaziar, sobras da minha já não tão recente mudança de casa (dois anos e meio já é mais que tempo para ter tudo em ordem… mas ainda não tenho), e em cujas estantes os livros começavam a transbordar por causa da falta de espaço. Estantes novas compradas, foi na hora de reorganizar algumas prateleiras (tenho os livros mais ou menos agrupados por categoria) que me ocorreu, inspirada pelo exemplo das duas supracitadas meninas, desafiar-me a mim própria a fazer qualquer coisa que me levasse a revisitar alguns dos meus livros mais antigos e ao mesmo tempo tivesse alguma utilidade para quem lê. Mais ainda, que me obrigasse a escrever neste meu blog com mais frequência (a minha inconstância não tem a ver com falta de vontade nem de ideias, mas sim apenas de tempo, pior ainda porque me desdobro pelos meus outros dois blogues - o de escrita e o de viagens - e não quero abandonar nenhum deles).
E surgiu-me então esta ideia: há sempre um livro desconhecido à espera de nós. Um livro de que nunca ouvimos falar, que provavelmente não foi um best-seller, que é de um autor pouco conhecido, ou que é de um autor muito conhecido mas já “fora de moda”; um livro que não teve reedições ou não foi “entronizado” pelos críticos, mas que mesmo assim é um livro que adorei ler, que já reli, que está na lista dos meus preferidos, e que se calhar também outras pessoas gostariam de ler… se soubessem que ele existe.
Está então aqui lançado o desafio – a mim, e a quem quiser aqui dar a sua opinião. Nos próximos tempos vou tentar falar-vos, com alguma regularidade (sem promessas, porque não gosto de prometer o que não sei se vou conseguir cumprir), de alguns destes livros que têm lugar cativo na minha biblioteca e no meu coração. Para vos aguçar o apetite. Porque há muita leitura para lá dos clássicos e dos escritores “mainstream”. E porque há imensos livros que merecem uma segunda vida.
É certo que pessoas são mais importantes do que qualquer bem material. Não é possível ignorar que muitos milhares de pessoas têm morrido nos últimos anos em todo o mundo por causa dos conflitos gerados pelos fundamentalistas islâmicos, a maioria delas de forma brutal e desumana. A maioria dessas vítimas mortas sem qualquer motivo que não o de estarem no lugar errado à hora errada. São crimes horrendos perpetrados em nome de um qualquer deus maior, em nome de uma crença e uma fé irracionais, fundamentada em premissas insanas. Não há palavras que consigam reproduzir o sentimento de revolta que isso causa em mim.
Mas também não posso deixar passar em branco as notícias da destruição que os extremistas fanáticos do Estado Islâmico estão a levar a cabo desde há alguns dias na cidade de Mossul, a segunda maior cidade do Iraque.
Entre outros actos igualmente inqualificáveis, militantes do Isis fizeram explodir a Biblioteca Pública, uma instituição fundada em 1921 que abrigava um enorme repositório de livros antigos e manuscritos raros, alguns deles datando do séc. XVIII. As notícias mais recentes divulgam que mais de 100 mil obras foram queimadas, incluindo uma enorme colecção de jornais do início do séc. XX, num enorme auto-de-fé que tem como “justificação” o simples facto de não reproduzirem a palavra de Alá.
Esta barbárie tem-se estendido a outros locais, infligindo grandes danos a vários edifícios institucionais e aos seus conteúdos, como é o caso da Biblioteca Muçulmana Sunita, da biblioteca da Igreja Latina e Mosteiro dos Frades Dominicanos (que data de há 265 anos), da biblioteca da Universidade local e do Museu de Mossul. Neste museu foi devastado um património cultural incalculável entre o qual se contavam estátuas mesopotâmicas milenares, cuja destruição é mostrada em fotografias e num vídeo divulgados há algumas horas pela comunicação social.
Hoje, em pleno ano quinze do séc. XXI, quando supostamente deveríamos estar a caminhar para um futuro mais civilizado, mais humano e mais esclarecido, a sensação que tenho é a de que por qualquer distorção no espaço-tempo regressámos à Idade Média. Não existe, não pode existir qualquer justificação lógica e racional para as atrocidades que são cometidas nos nossos dias, a coberto de supostos valores religiosos, por ensandecidos fanáticos que se autoproclamam senhores da verdade.
A falta de educação, de cultura, de conhecimentos pode justificar muita coisa. Mas não há nada que justifique a falta de humanidade.