Há sempre um livro desconhecido à espera de nós #1
Dando início ao desafio que me propus aqui há dias, a minha primeira sugestão é um livro que acho bem apropriado para ler em tempo de férias. Não será certamente um livro fácil de encontrar, mas existe à venda em segunda mão.
“A ESTRATÉGIA DO BOBO” de Serge Lentz
Título: A Estratégia do Bobo
Título original: La Stratégie du Bouffon
Autor: Serge Lentz
Ano de lançamento: 1990
Editora: Círculo de Leitores
Publicação: Outubro 1993
Número de páginas: 382
Tradução: António Gonçalves
Sinopse
Em Roma, incitado por uma mãe tão rica quanto ambiciosa, Nicolas d’Ausonne torna-se prelado com a idade de vinte e três anos. É um homem belo com um espírito brilhante, mas também um debochado sem emenda. Por ter apostado no cardeal errado na altura do conclave de 1458 (o chamado conclave das latrinas…), o jovem prelado cai em desgraça e vê-se exilado num mosteiro esquecido da região de Vallée Borgne, uma fenda árida e despovoada situada entre Cévennes e o Languedoc.
Acha-se assim na situação dos funâmbulos das feiras, que suscitam a admiração das pessoas quando caminham sobre um cabo, e o gozo de todos quando caem. Estes bobos nunca podem ser heróis, a não ser que voltem a subir para o cabo e consigam proezas ainda maiores.
Para Nicolas d’Ausonne, isto é uma questão de estratégia. E ele encontra o seu instrumento na pessoa de Marin, um monge com voz de ouro, misto de soldado, médico e por vezes burlão para as necessidades da sua causa. Ao contrário dos outros pregadores do seu tempo, que falam de um apocalipse eminente e encorajam os fiéis às mortificações mais violentas, Marin prega o amor de Deus através da alegria de viver e do bom uso dos prazeres da vida… Todos os prazeres!
Num séc. XV tão cristão, esta visão torna-se evidentemente a origem de várias desordens. É uma sucessão de furores e maravilhas, cruzadas com alcovitices e agressões, povoadas de gente brutal e de homens do clero, de monges errantes e de mulheres admiráveis, uma crónica tratada com aparato numa nuvem de palavras deslumbrantes. Tal como em “Les années-sandwiches” e “Vladimir Roubaïev”, também aqui Serge Lentz desfralda uma bandeira que ostenta as cores mais radiantes da vida.
(tradução da sinopse publicada aqui)
A minha opinião
Li e reli este livro, e agora que voltei a folheá-lo estou com vontade de o ler novamente. Tem todos os ingredientes que valorizo: um enredo original, contexto histórico, personagens cativantes, episódios rocambolescos, muito humor e muita sensibilidade. Está bem escrito, mas lê-se facilmente, quase de um só fôlego – ficamos agarrados desde as primeiras páginas, e não apetece largá-lo. Não há um único instante de monotonia nesta história que nos fala de amizade, de prazer, e de uma forma muito original de olhar para a religião. Os protagonistas são simultaneamente truculentos, amorais e adoráveis, mesmo nos seus piores momentos, e afeiçoamo-nos a eles de tal maneira que estamos o tempo todo a torcer para a que a história tenha um fim feliz.
A escrita de Serge Lentz é fluida, elegante e bem-humorada, e ele consegue imprimir ao texto a mistura adequada de gravidade e ligeireza para nos proporcionar uma leitura agradável, enquanto nos leva a reflectir de forma profunda e sensível sobre a natureza da fé.
Tendo feito a sua carreira profissional essencialmente como jornalista, Serge Lentz tem poucas obras publicadas, mas todas elas foram alvo de rasgados elogios e prémios. Infelizmente, creio que “A Estratégia do Bobo” terá sido o seu único livro publicado em português – pelo menos não encontrei mais nenhum nas minhas pesquisas na net. Mas há sempre a possibilidade de as ler em francês, para quem entender a língua.
Ou pode ser que um dia destes algum editor iluminado se lembre de publicar os seus livros no nosso país.